domingo, 22 de janeiro de 2012

Telecoteco por email - Para pensar e tocar


Recebi esse email semana passada e achei interessante trazer ao blog a conversa sobre o tema.
  
Oi sérgio, tudo bem? Feliz ano novo!
Aqui escreve Geraldo de Oliveira, percussionista de Belo Horizonte radicado em chicago desde 1975.
Gostei muito do seu livro "new ways of brazilian drumming".  Muito bom mesmo!
Tenho uma pergunta pra você. 
Já há vários anos venho ensinando percussão de 






samba nos EUA e uma das frase rítmicas que mais me intrigam é o famoso teleco teco. Veja em anexo uma folha que criei para meus estudantes (trecho reproduzido abaixo). Nela explico com detalhes como funciona o teleco teco nas escolas de samba, com a famosa introdução especial seguida da frase rítmica.

Observei no seu livro que você escreve o teleco teco da forma que a gente aprende e canta, com as duas colcheias no primeiro tempo do compasso, ao invés da síncope iniciada com a pausa de semicolcheia (no seu caso terceiro tempo do compasso).
Você poderia me explicar a diferença?  Estou um pouco confuso com a notação musical correta, pois já encontrei das duas formas em várias publicações. O pessoal das escolas de samba juram que estão certos, inclusive meu amigo Mestre Odilon.
 Agradeceria muito qualquer ajuda que pudesse prestar nesse sentido.

Obrigado,
Geraldo.

Oi Geraldo,
Por aqui tudo bem e espero que com você também.
Fico muito feliz que você tenha gostado do livro e que ele esteja sendo útil em seu trabalho.
Li o que você me enviou e vi o que chamo de telecoteco invertido, caracterísco do samba carioca, das canções de compositores como Paulinho da Viola, Nelson Cavaquinho, Cartola e tantos outros.
Não é possível e nem interessante generalizar que o "samba carioca é assim e o samba paulista é deste outro jeito", mas em diversas composições de Adoniran Barbosa, grande expoente do samba paulista, o telecoteco é tético, começa na cabeça do tempo, e isso é definido pelo ritmo da melodia e  reforçado pelo movimento do bloco harmônico. Ouvindo sambas de um mesmo compositor como Tom Jobim é possível perceber o movimento de uma ou outra frase como matriz, não necessariamente executadas na íntegra. "Samba de uma Nota Só" é um bom exemplo de uma frase que inicia e cadencia para a cabeça do tempo (on the beat) e "Piano na Mangueira", um samba "carioca" clássico (off the beat). 

Em conversa com Oscar Bolão, ele me disse que quando você simplesmente tenta encaixar uma levada num samba que pede a outra, você tende a mudar naturalmente, ou soa literalmente 'atravessado'. Ele está certo, claro, mas segue a questão de qual das duas é o telecoteco?
As duas, na minha maneira de ver. Ao lado o telecoteco e o telecoteco invertido e abaixo duas outras frases que estabelecem a mesma relação de "inversão". 
Pode ser questionado? Sim, mas não acho muito produtivo. O fato é que há diferentes tipos de samba mais característicos dessa ou daquela área com seus diferentes estilos. 
  
Um paralelo com as claves latinas pode ser ilustrativo. Qual a rumba clave original, 3-2 ou 2-3?
*A son clave mais clássica é a 3-2, que tem a frase quaternária (normalmente escrita em dois compassos de 4) começando na cabeça do 1º tempo, típica do bolero e usada no samba canção desde os anos 50 na música brasileira. Em geral, a tética tende a ser referência para sua inversão.
*Perguntei a Horácio Hernandez como saber qual das claves usar e ele pôs o dedo no ouvido, respondendo com o gesto que 'só ouvindo' para sentir e saber o que tocar.

Só pra finalizar, conheço e uso o "Batuque Carioca" do mestre Odilon e tenho grande respeito por ele, que é uma autoridade no samba. Isso não está em discussão de maneira nenhuma.
De qualquer forma, há áreas de imprecisão na 'academização da cultura popular'. Conhecê-las e seguir pesquisando é o mais legal, pois podem surgir novas ideias musicais, para tocar, compor e arranjar.

Meu site (www.sergiogomes.com) abre com um solo sobre o 'telecoteco invertido' com a 'clave da bossa' nova no pé esquerdo... Nossa quanta terminologia, né não?
Espero ter ajudado e um feliz 2012 para você também.

Abraço,
Sergio 

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